AS TUAS PEGADAS


Da janela do meu quarto sorria, feliz, olhando o sol que começava a despertar.
Apesar de pequenos, os seus primeiros raios iluminavam tudo à sua volta, e não tardou a mostrar o rosto sorridente.
O mar estava calmo, as águas eram de um azul transparente como há muito não via, e a areia brilhava intensamente.
Senti, naquele momento, que tinha de aproveitar aquele novo amanhecer tranquilo e único.
Rapidamente galguei as poucas escadas de pedra, gastas pelo bater do mar em dias de Inverno, que me separavam da praia.
Pisava agora a areia molhada e fina que servia de leito ao mar que começava a espreguiçar-se na tentativa de acordar.
Agradeci ao PAI por estar ali olhando o nascer do novo dia, de uma nova esperança, de um novo começo.
Sacudi o corpo, meio adormecido, e iniciei lentamente o caminho pela praia deixando que a água molhasse meus pés brancos e descalços.Parei por instantes e fiquei surpreendida com o que acabara de descobrir: na areia molhada, que se estendia à minha frente, podiam ver-se marcadas pequenas pegadas. Eram tão profundas, perfeitas e constantes que, num instante, me lembrei de ti e da paz que sempre sentia quando estávamos juntos.
Olhei atentamente e vi que iam surgindo uma após outra indicando o caminho que tinha de percorrer para te encontrar. Senti a tua presença tão perto que, apressadamente, procurei cobrir com o meu pé a pegada deixada pelo teu, na tentativa de mais rápido poder abraçar-te.
Era tudo tão estranho, mas ao mesmo tempo tão real, que não quis parar para não deixar de te sentir.
O passeio pela areia molhada tornou-se assim leve, cheio de encanto, mágico e fácil de percorrer.
No silêncio destes momentos, onde só ouvia o som do mar a espreguiçar-se e o bater sereno do meu coração, conversámos muito: recordámos nossos encontros no universo, as danças em noites de lua cheia, os passeios de fim de tarde quando o sol beijava nosso corpo cansado, abraços apertados sem despedida, as caminhadas pela montanha coberta de árvores e flores e o lago azul e transparente onde nosso barco de remos deslizava lentamente. Conversámos sobre a nossa infância, o carinho e sorriso de nossos pais, os sonhos vividos e os que ainda não se realizaram, nossas lições de vida aprendidas com alegria e sofrimento, nossas conquistas e derrotas e, sobretudo, sobre o amor que havia nos nossos corações.
O tempo passou tão rapidamente e ia tão absorvida neste caminhar constante e delicioso que acabei por não reparar que já não caminhava ao teu encontro.Surpreendida apercebi-me que as tuas pegadas tinham desaparecido na areia, e, sem compreender o que se tinha passado, parei e olhei o horizonte tentando descobrir-te para lá da rocha gigante que se via ao fundo.
O sol começava agora a subir lentamente no enorme céu azul repleto de pássaros que esvoaçavam e cantavam felizes.
Nesse momento deixei de te sentir para me sentir!
Deixei de te ver para me ver!

Foram momentos de grande perplexidade, mas acabei por descobrir que afinal não seguia as tuas pegadas.
O que na realidade aconteceu é que naquele amanhecer silencioso e tão belo tinha encontrado a minha verdadeira essência.
Aquelas pegadas não eram senão as minhas pprias pegadas.
Tudo foi criação minha!
Tudo foi vivido apenas por mim!
A vivência feliz daqueles momentos vinha da alma, da mente e do corpo que estavam em perfeito equilíbrio.
Então senti a magia da co-criação!
Afinal quem era eu?
Sussurrando baixinho, uma voz interior respondeu: tu és centelha Divina que brilha e pulsa sem parar, és o que sentes, és amor e una com a vida.
Sentei-me na rocha gigante e dourada, agora à minha frente, fascinada com o que acabara de descobrir.
Deixei que as ondas do mar salpicassem o meu rosto, já desperto, e ao fazer o caminho de regresso não pude deixar de sorrir.
Deixei que a minha criança interior saltasse e senti que era verdadeiramente feliz.

Tinha a certeza que, a partir desse dia, a minha vida sofreria uma grande transformação.
A minha felicidade dependia do amor que eu sentia por mim.
Com humildade agradeci as tuas pegadas que me ajudaram a encontrar as minhas.

JANELA DA ALMA


De olhos fechados, abro a janela
Que tem tanta cor
Solto-me do corpo apressada
Voando sem asas, cheia de amor

Mergulho bem fundo, no lago salgado
Sem nada esperar
Corro sózinha, descalça, sem roupa
Tentando lembrar

Esqueço o passado, destruindo meus medos
Encontro o perdão
Viajo no tempo presente
Não sinto pena, mas sim compaixão

Descubro a criança tão frágil e doce
Em busca da Paz
Pego-lhe ao colo, olhando nos olhos
A força que sinto me torna capaz

O Silêncio ajuda-me nesta viagem
Que em tempos já fiz
Perco amigos, encontro caminhos
Mas sou tão feliz

Aprendo com sábios e mestres antigos
Que se alimentam de amor
Coloco desejos no sol dourado
Que solto no ar com tanto fervor

Acontecem milagres quando preciso
Estou a acreditar
Retiro a máscara disforme e pesada
Não é necessária para todos amar

Encontro o equilíbrio do corpo e da alma
Aprendo a viver
De olhos fechados vou à janela
Abro o coração. Deixo acontecer!