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O meu abraço cheio de carinho


Celebro o nascimento do Novo Ano

Íris....uma dádiva maravilhosa de 2011

Sentado a meu lado
jaz 2011
cansado, velho
feliz...
cumpriu sua missão
até ao fim.
Vivi momentos bons
alguns difíceis
outros...confesso
nem senti.
Como ele sorriu para mim...
Olho-te agora com saudade!
Agradeço-te  o que aprendi
o muito que cresci
tudo o que vivi.
Tanta sabedoria!
Experiências novas
 sonhos realizados
fui tão feliz!
Teu tempo está a terminar...
Não vou esquecer
tudo que me ensinaste.
Novas escolhas vou fazer
a natureza vou amar
ainda mais.
Darei mais abraços
distribuirei mais sorrisos
estenderei mais vezes
a mão
ao meu irmão.
Direi mais vezes
Amo estar viva!
Aceitarei com alegria
o que me acontecer.
Seguirei a minha intuição
sem hesitar....
como quando era criança.
Saberei dar, receber
não vou esquecer
de agradecer
em cada amanhecer.
Adeus 2011.
Vou celebrar agora
o nascimento do 2012
tão esperado.
Um Novo Mundo
irá nascer
vamos todos ajudar
para crescer.
Em paz e com amor
vamos viver.
Ícaro.....outra dádiva maravilhosa de 2011

Feliz 2012


Um Santo e Feliz Natal


e um 2012 cheio de esperança.




O MEU CAMINHO A SANTIAGO: Valença/Santiago

Valença - Pontevedra

O dia amanheceu chuvoso, com relâmpagos e trovões à mistura, mas mesmo assim os peregrinos mantiveram-se confiantes e há hora combinada chegavam a Valença.
Depois de um cafezinho e de mochilas às costas, um a um foi colocando a sua capa impermeável para se proteger da chuva 
Tal como no filme o disforme corpo contrastava com o amor que sentimos no coração e percebi, nesse momento, que seria uma caminhada inesquecível.
A chuva deixava de cair com tanta intensidade e depois da habitual oração, feita a escassos metros do Albergue de Valença, soltamos o nosso grito ULTREYA e pusemo-nos a caminho.
Atravessámos a Ponte Internacional, obra do arquitecto Gustave Eiffel, sobre o rio Minho em direcção à cidade de Tui e admirámos o rio que lá em baixo seguia o seu curso calmo e tranquilo.
Já em Tui, o guia informou que as setas amarelas que até aqui vínhamos seguindo seriam substituídas por conchas/vieiras colocadas nas paredes dos edifícios ou em marcos de pedra onde surgia também a indicação da distância até Santiago.
Aproveitámos para tirar a primeira foto do grupo, em terra espanhola, junto do primeiro marco que nos apareceu.
Continuámos em direcção ao velho porto e percorremos caminho até à zona antiga de Tui seguindo o denominado Caminho da Barca.
Mais à frente lá estava a Catedral Fortaleza de Santa Maria de Tuí, obra romântica e gótica, com capelas e naves que se enfeitam com imagens e pinturas do século XVI-XVII.
Deixamos as mochilas à porta e visitámos a catedral que estava maravilhosamente enfeitada esperando, provavelmente, uns noivos que ali iriam unir o seu destino.

Logo à entrada, depois de carimbar a credencial, deparei com o Arcanjo S. Miguel empunhando a sua espada divina e senti que ele protegia todos os peregrinos que por ele passavam ou que a ele se dirigiam numa pequena oração.
É um anjo lindo, maravilhoso e só de contemplá-lo nos sentimos protegidos com a sua força e luz!
Seguimos caminho atravessando pelo túnel do Convento das Clarissas, descemos uns degraus e chegámos ao sítio onde estava a Porta Bergana, um dos acessos à antiga cidade medieval.
Ao passarmos por estas ruelas, com suas casas bem recuperadas, parece que recuamos no tempo e vivemos por segundos na era medieval.
Aqui, acredito que os mais atentos podem  viajar através dos tempos e pensar que um dia já foram reis, rainhas ou  simples guerreiros.
Deixámos Tui para trás e caminhámos pela estrada N-550 até chegar à capela da Virgem do Caminho onde fizemos mais uma oração.
Daqui seguimos por caminhos verdejantes e veredas cheias de flores, meladas pela chuva caída durante os últimos dias, até à Ponte das Febres.
É uma pequena ponte de um só arco, de pedras gastas pelo tempo, que passa sobre o rio São Simão, um afluente do rio Louro.
 Para facilitar a passagem encontra-se agora revestida com tábuas de madeira, como se pode ver.
Neste lugar São Telmo, que fazia a sua peregrinação a Santiago, adoeceu e acabou por morrer.
Para assinalar a sua passagem há um marco onde se pode ler:
 "Aqui adoeceu mortalmente São Telmo em Abril de 1251.
  Pede-lhe que fale com Deus a teu favor".
Neste percurso o caminho encontrava-se bastante enlameado e esburacado mas nem por isso deixámos de sentir a verdadeira essência da natureza.
Mais à frente paramos no Bar Novo Cazador para almoçar e recuperar forças para o caminho longo que ainda nos esperava.
Em breve chegámos à zona industrial de Porriño e as rectas que tivemos de percorrer pareciam não ter fim. Sorte tivemos pelo tempo fresco que se fez sentir pois, em dias de calor é um verdadeiro suplicio por ali passar.
Uma vez em Porriño e em direcção a Mós uma grande alegria invadiu o nosso coração e foi lindo ver a união dos peregrinos que, ao soltarem a sua criança interior, entoaram, em várias vozes, canções bem conhecidas e cheias de significado.
Neste estado de perfeita harmonia com a natureza conseguimos percorrer os km que ainda faltavam com mais energia e entusiasmo.
 
Depois de um sono repousante começámos a nossa caminha pelas 8h da manhã.
Apanhámos uma subida bem penosa, de alcatrão, onde o nevoeiro ainda encobria o sol que sabíamos nos iria acompanhar durante este novo dia.
Já no alto da subida e antes de descermos para Redondela encontramos um monumento comemorativo do Xacobeo.
Chegámos a Redondela e deparámos, mesmo junto do Albergue, com uma feirinha Medieval que nos fez recuar novamente no tempo e viver por momentos na idade média.
O albergue, situado num edifício histórico do Século XVI, que dá pelo nome da casa da Torre, é um dos principais do Caminho Português e mais do que um albergue é também um ponto de convívio dos habitantes da vila.
Faltavam ainda 15km para Pontevedra, não podíamos ficar mais tempo a viver aquele ambiente tão acolhedor e tão mágico, por isso não tardámos a prosseguir viagem.
O sol abraçava-nos com carinho e brindava-nos com os seus raios mornos e luminoso.
Sorri ao olhar o grupo que hoje tinha um aspecto totalmente diferente e que mantinha alegria e motivação para iniciar a subida íngreme que mais à frente esperava por nós.
Passada a ponte do caminho-de-ferro, o caminho era agora feito numa zona de floresta e em silêncio.
Depois da subida e de respirarmos aquele ar puro, lá estava a descida para Arcade, com uma vista panorâmica deslumbrante sobre a ria de Vigo.
Olhei de longe e vi pequenos barcos que deslizavam naquelas águas tranquilas, brilhando sem cessar.
Deixei que a minha imaginação me transportasse para lá por breves segundos e senti que toda aquela paisagem estava envolta numa aura dourada que fazia lembrar o paraíso reproduzido por alguns pintores famosos.
Foi um momento maravilhoso!
Atravessámos Árcade, pelas típicas ruas e chegámos à histórica Pontesampaio.


Fizemos uma paragem para uma merendinha, aproveitámos para carimbar a credencial e iniciámos nova subida. Aqui, as pedras misturavam-se com lama e pedaços de paus arrastados pelas chuvas mas, mesmo assim, não deixou de ser um caminho bonito e com um agradável cheiro a eucaliptos que nos purificou os pulmões, ajudando-nos a continuar. Descemos até ao rio Ullo, passámos sobre um arco de volta inteira, com um cenário natural de rara beleza e de novo uma subida, desta vez uma velhíssima calçada que nos levou até Cacheiro.
No final, o caminho alargou-se por entre campos, vinhas e pomares e não tardou entrámos em Pontevedra. O cansaço era muito mas estávamos felizes!
Descansámos no belíssimo Albergue, que mais à frente esperava por nós.


Pontevedra -Padron


Eram 10h15m quando iniciámos o caminho, com a nossa oração habitual e o grito ULTREYA, em direcção à praça “ A Peregrina” onde se encontra o Santuário da Virgem Peregrina, datado do séc. XVIII.
Preparávamo-nos para entrar, com a intenção de admirar a sua beleza e pedir à Virgem Mãe a sua protecção, quando deparámos com obras de restauro.
Um pouco tristes, admirámos o seu exterior que  mostrava a sua forma semelhante a uma vieira (concha), e por ali permanecemos alguns minutos contemplando a praça  antiga, onde sobressaíam as varandas de madeira de vária cores, e pedindo protecção à Virgem para a viagem.
Continuámos caminho pela antiga Porta de Trabancas, percorremos a cidade velha até à milenária ponte de O Burgo e contemplámos e atravessámos o rio Lérez que neste local se lança na Ria de Pontevedra. Alcançámos a margem norte entrando pela rua da Santinha, onde se conta que no nº 95 ofereceram os primeiros frutos das colheitas a S. Tiago, e continuámos por um caminho verdejante, ao longo de todo o vale do rio da Gândara, passando pela Igreja de Santa Maria de Alva e Capela de S. Caetano.
Percorremos os bosques de Reiriz e Lombo da Macieira e foi por aqui que uma peregrina encontrou dois trevos de quatro folhas quase sem olhar.
Foi um momento lindo, simples e único que proporcionou uma partilha de sabedoria e magia.
Depois de deixarmos San Mauro para trás encontramos uma fonte de água potável que nos proporcionou mais um momento de frescura e seguimos por uma pequena estrada alcatroada, com uma paisagem linda, até Valbon. Aí admirámos dois interessantes cruzeiros e no fuste do outro, Santiago Peregrino indica aos romeiros o caminho.
Parámos para saborear o nosso farnel no Alto da Portela, junto a uma capelinha fechada e abandonada, e aproveitámos também para aliviar os pés e descansar já que o calor era muito e ainda faltavam percorrer alguns km até ao nosso destino.
Um cafezinho soube-nos bem nesta altura!
De energias renovadas continuámos caminho circulando o Rio Lamas, ao longo da sua margem esquerda, até chegarmos a Brialhos.
O destino era o Albergue Brialhos-Portela e depois de uma travessia por caminhos cheios de vinhas, ao som do cântico dos pássaros, finalmente chegámos.
Ali estava ele, praticamente novo, á nossa espera com um lindo campo cheio de relva e baloiços. Entrámos e esticámo-nos a descansar na convicção de que teríamos lugar para todos, dada a sua dimensão, mas ficámos desapontados quando soubemos que os beliches eram poucos, alguns estavam já ocupados por outros peregrinos, para um grupo tão grande como o nosso.
Depois de vários contactos, feitos pelo incansável guia, fomos informados que alguns dos peregrinos teriam de ficar no pavilhão Gimnodesportivo.
Os obstáculos surgem a cada momento no caminho, tal como na nossa vida, e mais unidos do que nunca rapidamente voltamos a sorrir. Tomámos um bom banho, descansámos na relva macia nosso corpo dorido, ao som da voz de uma peregrina que deu mais uma lição sobre alimentação macrobiótica.
A caça aos grilos e os baloiços fizeram-nos recuar no tempo e na idade.
Não tardou aparecer o transporte para nos levar ao Parque Natural Ria Barosa, a poucos km dali, e digno de ser visitado.
Chegámos perto da hora do jantar, deliciámo-nos com a sua água cristalina, que em cascatas entoava verdadeiros hinos de agradecimento à natureza.

A beleza do local e a sua frescura foi como uma bênção para todos os peregrinos que sob sol intenso caminharam todo o dia.
Pensei nessa altura que a recompensa divina é dada quando menos esperamos e agradeci aquele lugar repousante e refrescante.
O moinho antigo, junto da cascata, esperava por nós para jantarmos e enquanto aguardávamos as costelinhas grelhadas,  saboreámos a deliciosa bola de soja, feita por uma peregrina, que serviu de entrada. 

Depois de um dia tão intenso a Guarda Civil, gentil e prestável, escoltou-nos amavelmente ao Albergue e ao Pavilhão para o merecido descanso.
Bem cedo nos levantámos no dia seguinte para continuar viagem.
Os hospitaleiros do Albergue não foram nem simpáticos, nem amigáveis mas este contratempo só veio ensinar-nos que no caminho nem tudo pode ser perfeito.
Reunimo-nos ao resto do grupo e continuámos em direcção a Caldas de Reis onde entrámos pela Igreja de Santa Maria, de estilo românico, datada do séc.XII.
Atravessámos a ponte sobre o rio Umia, local de grande beleza,

e fizemos um breve descanso na Fonte das Burgas, aproveitando para molhar os pés na água quentinha que jorra da boca de dois leões desde 1881.
 Parámos para tomar o pequeno-almoço e abandonámos Caldas de Reis percorrendo a Rua Real até à ponte medieval sobre o rio Bermana, uma das áreas mais interessantes desta cidade, onde fomos admirando as casas antigas de varandas de madeira e em bom estado de conservação.

O caminho era agora pelo vale do rio, rodeado por bosques centenários. Passámos pela interessante igreja românica de Santa Maria de Bemil e mais à frente lá estava a igreja de Santa Marina de Carracedo.
Depois da visita e feita a oração continuámos passando por Casal de Eirixio e O Pino e embrenhámo-nos em bosques profundos, através do monte Albor, num percurso que considero dos mais lindos do caminho de Santiago.
Os fetos verdes e gigantes, os pinheiros e os carvalhos eram salpicados de flores multicolores que tornavam o caminho de rara beleza.
O rio acompanhava-nos neste percurso e o som que até nós chegava fazia-nos sentir que aquele lugar era mesmo muito especial.
Apeteceu-me ficar por ali a saborear aqueles momentos sentindo o sol bater no meu rosto e iluminar meu corpo já cansado de tanto caminhar mas, não havia tempo para mais uma paragem. Voltei rapidamente aos meus tempos de criança e de onde em onde fui colhendo flores recordando o seu nome. Ao chegarmos ao fim do percurso tinha nas mãos o mais lindo ramo de flores campestres, que alguma vez imaginara, e senti a magia das suas cores misturado com o cântico que a minha alma cantava em silêncio. Foi sem dúvida um percurso maravilhoso, de regresso à minha infância, de encontro com a minha verdadeira essência e recordei com amor meus pais que há muito partiram. O lindo ramo de flores foi admirado por alguns dos peregrinos que me acompanharam de mais perto naquele percurso e que também contribuíram para a sua inegável beleza.
Já perto do moinho de Solleiro caminhámos até chegar a San Miguel de Valga e iniciámos a descida para passarmos o rio Ulla.
A descida foi linda!
Apesar dos troncos velhos cortados e lançados ao chão, que nos obrigou a ter mais cuidado para evitar alguma queda, a paisagem era maravilhosa e no silêncio do percurso senti a natureza, tal como nós, a ser renovada.

Ali estava ela: linda, com o sol beijando o seu rosto e sorrindo apesar de lhe terem cortado algumas das suas árvores.
Naquele momento o meu coração saltou de alegria por estar naquele local e agradeci ao PAI a minha existência e a de todos os peregrinos que me acompanhavam. Estava feliz envolta no silêncio da natureza, onde só se ouviam os nossos passos, o som do rio cantando baixinho e o piar dos pássaros. O sol morno beijava meus braços desnudados e senti-me em perfeito equilíbrio e em total liberdade.
Lembro-me de ter pensado que a escolha do caminho é por vezes determinante para alcançarmos o nosso verdadeiro equilíbrio mas, acredito que qualquer caminho, por mais difícil que seja, se for percorrido sem medo, com fé e escutando o coração acaba por se tornar cada vez mais fácil e gratificante.
No fim do caminho há sempre uma luz à nossa espera e é ela que nos guia e nos dá força para continuar.

 No fim desta descida rápida e silenciosa atravessámos a Pontecesures, de origem romana, e pela N-550 percorremos caminho até encontramos Padrón, na margem oposta do rio Ulla.
Atravessámos a zona da feira, que se encontrava com aspecto sujo e pouco apresentável à vista, devido á feira que ali se tinha realizado, e procuramos um café para descansar e comer alguma coisa. Mais reconfortados e descansados visitámos finalmente a Igreja de S. Tiago onde pudemos ver o padrão onde foi amarrada a barca do Apóstolo e que deu o nome a esta cidade.
O resto de sol que ainda brilhava no céu foi aproveitado, por nós, à beira do rio para descansar.

Mais uma etapa concluída com fé, com amor e em perfeita harmonia.

Padron - Santiago

 
Iniciamos o caminho, às 7h da manhã, o ultimo que nos levaria a Santiago.
O calor fazia-nos adivinhar uma etapa difícil, não só pelo calor excessivo que se previa mas, também, pelas subidas e descidas que ainda tínhamos de fazer.
 O grupo contava com 33 peregrinos e pensei, no momento, como era bom termos conseguido chegar ao fim com um grupo tão grande e tão unido.
Agradeci ao Santo a sua ajuda e lembrei-me da minha 1ª. peregrinação, onde fomos apenas 12 a terminar o caminho.

 Reunimo-nos no parque, em frente à Igreja de S. Tiago, com o rio Ulha correndo tranquilamente no seu leito, ainda adormecido, e onde as árvores se abraçam e entrelaçam numa harmonia perfeita, para recebermos informações do nosso guia e fazer a habitual oração.
Ao som do grito ULTREYA SUSEIA, deixámos a cidade em direcção ao norte até à Colegiata de Santa Maria de Iria Flávia, sede episcopal antes da sua transferência para Santiago de Compostela, associando-se este local à poetisa Rosália de Castro, aqui sepultada e o Nobel Camillo José Cela aqui nascido. Continuámos caminho pela N 550, ao longo de 1 km, saindo depois para começarmos a percorrer as lindas aldeias de Romaris, Rueiro, Cambelas, Anteportas e Vilar, no Vale do rio Sar.
Percorríamos caminhos estreitos, ladeados por campos de cultivo à mistura com árvores de frutos e onde as videiras mostravam já os verdes e minúsculos cachos de uvas que, vaidosos, espreitavam por entre a abundante folhagem.
Os espigueiros, destinados a guardarem os cereais ou alimentos para os animais, estavam bem conservados e rodeados de lindas flores que nos sorriam e nos convidavam a uma fotografia.
O calor começava apertar, o nosso corpo mostrava já sinais de cansaço e as mochilas pareciam pesar mais do que nunca. O silêncio de alguns e a conversa animada de outros fez-me sentir com alegria que o grupo, durante todas as etapas, foi livre de escolher a melhor forma de fazer o caminho e o respeito que cada um teve por si e pelos outros foi tornando este nosso caminhar numa aprendizagem constante, não só a nível físico como a nível espiritual.
O caminho levou-nos até ao Santuário barroco da Nossa Senhora da Escravitute, erguido sobre uma fonte onde, em 1732, teve lugar o milagre que motivou a sua construção. Aproveitámos para descansar e beber a água fresquíssima que jorrava da fonte. Depois de passarmos pela Igreja de Santa Maria de Cruces, continuámos entre bosques até chegar à pequena povoação de Angueira de Suso descendo novamente à N 550 que percorremos, pela sua berma, durante cerca de um quilómetro. Ao longo do percurso o contacto com a natureza foi-nos transformando em seres mais conscientes e por isso mais atentos a todos os pormenores.
Não deixamos de reparar na arruda, conhecida como erva protectora e com "poderes" contra o mau-olhado e vibrações negativas, que nos sorria através das suas flores amarelas, de cheiro bem característico, e não nos escaparam as pequenas maçãs, já maduras, caídas de uma árvore à beira do caminho que tão bem nos souberam.
Mais à frente o grupo dividiu-se: os mais afoitos rapidamente desapareceram, como fumo, e não tardou que depois de percorremos alguns km sobre calor intenso o esgotamento físico fosse sentido por alguns de nós. Nessa altura, nem pensamos duas vezes, refastelamo-nos à sombra da enorme vegetação do bosque que agora percorríamos, para descansar, beber água e recuperar forças.

Estávamos no auge do calor, eram 13 h, e sentimos que não havia necessidade de caminhar tão apressadamente, por isso o descanso nos soube tão bem.

Passámos assim  20 minutos, num piscar de olhos, e mais animados e frescos deixámos o aprazível local e subimos mais um pouco, passando ao lado do Albergue de Teo, local que muitos peregrinos aproveitam para pernoitar no último dia da caminhada, atravessando num pontão a linha-férrea.
Aqui, começámos a sentir a proximidade da grande cidade e não tardou a chegarmos a Milladoiro onde, numa agradável cafetaria, o grupo pioneiro já se instalara. Nessa altura nem podia acreditar que tinha chegado sã e salva àquele local que me pareceu um verdadeiro oásis no meio do deserto.
O meu rosto e o de alguns dos peregrinos, estavam tão vermelhos que mais pareciam romãs acabadas de colher. O suor escorria pelo corpo, a sede era tanta que rapidamente bebemos até mais não poder e acabámos por aproveitar aquele acolhedor local, durante umas boas 2h, para almoçar e esperar que a temperatura descesse um pouco para voltarmos ao caminho.
Eram já 16h quando refeitos e quase como novos, de corpo e alma, subimos em direcção ao Agro dos Monteiros. Aproveitámos para parar um pouco e desfrutar da linda paisagem sobre a cidade e avistámos, pela primeira vez, as torres da Catedral. Descemos depois pela encosta, atravessámos a linha férrea e entrámos finalmente na cidade pela árdua subida da Choupana.
Percorremos as Avenidas de Castro e Juan Carlos I e encontrámos a Alameda da Ferradura, onde fica a porta Faxeira, entrada tradicional do Caminho Português na cidade velha.
Eram 18h e a tarde continuava quente e luminosa.
O encontro com Santiago seria no dia seguinte, por isso dirigimo-nos para o Albergue de Peregrinos, no Monte do Gozo.
Fiquei surpresa com as magnificas instalações que nos esperavam e depois de subirmos uma enorme escadaria, encontrámos a recepção onde apresentámos as credenciais esperando pela distribuição dos quartos.
Um bom banho, uma muda de roupa e ficámos prontos para o jantar.
Ali perto, já no caminho Francês, encontramos o restaurante onde saboreamos uma refeição económica e participámos num convívio agradável e saudável entre todos os peregrinos.
A aceitação de todos, o entusiasmo e a alegria do grupo mais uma vez me fez sentir que éramos um grupo especial, unido, cheio de fé, com espírito aberto e cheio de luz.
Levantámo-nos cedinho no dia seguinte, tomámos o pequeno-almoço, nas belíssimas instalações para esse efeito, e numa última oração unimos as mãos e agradecemos ao Altíssimo.
SUSEIA, foi o nosso último grito!
O tempo fresco fez-nos percorrer, num ápice, os 4km que faltavam para entrarmos na catedral.
Chegámos à praça do Obradoiro, Km zero, cheia de peregrinos e grupos de jovens, com um sorriso de alegria, com olhos a brilhar de felicidade e tirámos ali mesmo a fotografia de grupo, para um dia recordar.

Grandes emoções nos esperavam ainda e a missa do peregrino não tardou a começar.
Entrámos na catedral silenciosos e aguardámos tranquilamente pelo seu começo.
Juntos, celebrámos a nossa chegada, agradecemos a Deus e ao Apóstolo esta vitória e os ensinamentos dos nossos companheiros de caminhada.
Recordámos o início da caminho, os momentos de encontro com a nossa Essência, a força que descobrimos existir em nós, o sofrimento físico provocado por bolhas, unhas negras, músculos dorido, pontapés, quedas, arranhões e também a cura que a natureza, gratuitamente, nos ofereceu.
Os abraços, o perdão, o amor incondicional e o obrigado misturado com lágrimas, sorrisos e silêncios fizeram deste momento, para sempre, inesquecível.

Visitámos depois o sepulcro de Santiago, onde aproveitámos para orar e meditar, pedindo orientação para continuarmos a viver a nossa vida em perfeita harmonia.

Por fim, o abraço à estátua do Apostolo que preside a Basílica, desde o Altar Mor, o último agradecimento, a ultima oração pelos que ficaram e nos são tão queridos e um ultimo pedido pessoal.
No final recolhemos o documento, a Compostela, que atesta que caminhamos a pé até Santiago e o motivo pelo qual o fizemos. Nesta altura, de missão cumprida, a paz invadiu o nosso corpo e a nossa alma e senti que todos, em uníssono, estávamos em estado de graça.
Depois do almoço, por entre abraços e beijos de despedida vi tristeza e saudade em alguns olhares, mas a promessa de um reencontro, em breve, voltou a fazer-nos sorrir e a desejar fazer de novo este CAMINHO.

Para aqueles que desejarem passar por esta magnífica experiência eu deixo a seguinte mensagem:
Todos os caminhos nos levam ao mesmo destino, mas todos eles são diferentes, pois tudo depende de quem o faz, do seu estado de alma e dos olhos com que o vêem.
Apesar de tudo, quem faz o caminho nunca mais volta a ser a mesma pessoa pois existe sempre uma grande transformação.


Para terminar deixo-vos com uma mensagem de Eugene Ware:

“Todas as vitórias nascem quando ousamos começar "



O MEU CAMINHO A SANTIAGO (continuação)



Ponte de Lima/ Valença
Abril de 2008

Eram 9 Horas do dia 26 de Abril e o grupo de peregrino atravessava a monumental ponte romano/gótica, de 22 arcos, sobre o rio Lima.

Sabíamos que este percurso seria um dos mais bonitos e também um dos mais difíceis, contudo estavamos preparados para ultrapassar qualquer dificuldade, apesar do calor que já se fazia sentir.

Passámos junto à Igreja de Santo António da Torre Velha, viramos à direita e passamos junto da Capela do Anjo da Guarda, que ao longo dos séculos tem testemunhado a passagem de milhares de peregrinos. Fizemos o percurso até Arcozelo, por entre quintas e caminhos de terra e pedra, cheios de vegetação e poças de água.
À minha frente seguia um grupo que ora escorregava aqui, ora escorregava ali, nas pedras húmidas e enlameadas pela últimas chuvas e na preocupação de não escorregar também agarrei-me a um ramo de silvas que, sem qualquer compaixão, me picaram até doer. Ao largá-las não consegui o equilíbrio necessário e antes mesmo de me aperceber já estava com os pés enterrados numa poça enlameada e funda.
Oh meu Deus!
Olhei para trás, com olhos de suplica, e socorreu-me prontamente uma peregrina que não parava de rir. Não tive outro remédio senão percorrer, neste “estado lamentável”, alguns km até encontrar um riacho de água límpida, para me lavar. Mas, como acredito que nada acontece por acaso o longo caminho que tive de fazer, sob um sol intenso e um calor abrasador, tornou-se mais fácil, com os pés e sapatilhas sempre bem fresquinhos

Durante este percurso fomos admirando as cores com que eram enfeitados os caminhos: o amarelo das giestas e dos tojos e o lilás das urzes que estavam nesta altura completamente desabrochadas.

A paisagem era linda... e o cheiro característico dos eucaliptos ajudava-nos a respirar aquele ar puro que a natureza, com amor, nos oferecia a troco de nada.
Com ajuda do cajado fomos subindo devagar, sentindo o coração da serra da Labruja bater em uníssono com o nosso.


Mais 1Km e começámos a descer por entre olivais e dirigimo-nos para a Ponte da Geira sobre o rio Labruja.
O som do rio a correr por entre a vegetação parecia uma melodia preparada para ajudar os peregrinos a subir a encosta que mais acima esperava por nós.

Continuámos caminho pelo monte, em direcção ao Salgueiro, e cruzamos novamente o rio Labruja, agora na Ponte do Arco. Uns metros mais à frente fizemos a nossa grande paragem para nos refrescarmos. Mesmo ao lado, lá estava a belíssima Capela da Senhora das Neves e no adro um lindo cruzeiro. Entramos para fazer a nossa oração e de forças retemperadas e cheios de fé, continuámos encosta acima, por entre videiras, carvalhos, pinheiros e oliveiras em direcção à Portela Grande da Labruja.
E foi aqui perto, mergulhado num mar de pinheiros, que avistamos a Cruz dos Franceses, assinalando o local onde a população da Labruja emboscou os soldados do exército de Napoleão, na invasão de 1809. Fizemos uma breve paragem para sentir a energia deste local, tirar umas fotos e recuperar o fôlego.Tínhamos já 12km percorridos e, sem olhar para trás, subimos na vertical até ao cimo da serra.
Em cada passo dado sentíamos o nosso coração bater apressadamente em todos os pontos do nosso corpo e apesar de parecer estranho ao mesmo tempo fazia-nos sentir algo de maravilhoso....
Uma sensação de plenitude, de liberdade e de união entre o corpo e a alma foi o que senti neste subida.
O silêncio que se fazia sentir era quebrado pelo som da água correndo pela montanha e pelo respirar mais ofegante de alguns dos peregrinos.
Sentíamo-nos cansados e felizes!
Ao chegar ao cimo da serra ficamos maravilhadas com o lindo arranjo de malqueres amarelos, que parecia ali colocado por alguma mão Divina para nos receber e recompensar pela nossa coragem.
Que pena não ter ali a máquina para registar tal beleza!
Sorrindo, agradecemos ao Universo tal espectáculo e sentimo-nos abraçadas pela serra que acabávamos de subir.
Um grupo que caminhava à nossa frente já estava a instalar-se perto da casa da Guarda-florestal onde, uma bica de água fresquíssima esperava por nós.
Tínhamos combinado saborear neste local a merenda que trouxemos de casa e que carregámos nas nossas mochilas ao longo de toda a subida.
Esperámos mais uns minutos pelo resto dos peregrinos e um após outro lá foram chegando.
Por último apareceu o nosso companheiro mais idoso e também principiante, que não esmoreceu à dura subida e ao calor intenso que se fez sentir durante todo o percurso.
Foi uma lição de fé, de auto-confiança e de amizade, já que alguns peregrinos o ajudaram e acredito que também algum Anjo o ajudou, não fosse o cansaço empurrá-lo para trás.
É nestes momentos que esquecemos o que temos e mostramos o nosso valor pelo que somos! Permanecemos por 2 horas neste local aprazível, saboreando o farnel e descansando à sombra dos pinheiros.
Que delícia!


Completamente recuperados, do grande esforço feito na subida,  voltamos ao caminho descendo até Cabanas.
Já em Paredes do Coura ficámos maravilhados com as imensas quedas de água que cantavam à nossa passagem e também com moinhos bem conservados.

Seguimos depois até Agualonga, atravessámos uma velha ponte para chegarmos à Capela de S. Roque e percorrendo um espesso bosque chegamos finalmente à Igreja Românica de Rubiães.
Dirigimos-nos para o Albergue de peregrinos de S. Pedro de Rubiães, onde tomámos um agradável banho, descansámos e pernoitámos.
A noite estava tranquila e depois de um simples jantar adormecemos como anjos.
Um novo dia começava e bem dispostos começámos a percorrer os poucos metros da Estrada Nacional que nos levou à ponte românica de Rubiães.
Atravessámos a ponte, percorrendo o chamado Couto das Cabras, parámos para o pequeno-almoço e continuamos a caminhar na direcção a S. Bento da Porta Aberta.




Neste pequeno percurso, eu e outra peregrina, assistimos a algo de maravilhoso que não posso deixar de aqui descrever.
Talvez seja impossível mesmo descrever na sua totalidade tal acontecimento pois, além de não ser esperado, nunca tinha visto nada assim com tal intensidade.
À nossa frente, naquele imenso céu azul, ondas de energia oscilavam e brilhavam.
Sentíamos essa energia chegar até nós e espalhar-se sobre aquele local que parecia celebrar tal espectáculo.
Era tudo verde, brilhante e mágico!
Olhámos os pinheiros, que se erguiam majestosos e verdejantes, e lá estava a sua aura transparente e luminosa que conseguíamos ver sem qualquer esforço.
Esta sensação de leveza, de beleza, de luz, de energia interior e exterior acompanhou-nos no resto da nossa caminhada e foi partilhada, por nós, com alguns dos peregrinos que caminhavam mais à frente sem nada terem notado.
Aprendemos que estar atentos pode levar-nos a ter experiências maravilhosas e acreditar que o mundo onde vivemos é realmente mágico! Rapidamente chegámos a S. Bento da Porta Aberta.
Procurámos a Capela para fazermos a nossa oração e continuamos caminho ao som do sino da capela que parecia despedir-se de nós.
Percorremos a grande descida para Fontoura, encontrámos uma humilde representação de N. Sr. dos Caminhos, um verdadeiro símbolo do Caminho em Portugal, e na passagem por Cerdal já o cansaço era muito.
Decidimos fazer uma última paragem para retemperar forças e percorrer os 3km que faltavam até Valença, onde chegámos perto da hora do almoço.
Dirigimo-nos ao Albergue de Peregrinos onde a relva verdinha e fresca nos convidou a repousar e a uns exercícios de relaxamento. 
(Continua...)